Idalécio

Idalécio

"O mundo é complicado e divertido. Isto é uma brincadeira…Ou uma tentativa de brincadeira".
Palavras que revelam a descomplicação da visão de Idalécio. Ele acarinha as suas peças como "bonecos" com "nascimentos" que são partos provocados por quatro instrumentos: o cêpo, um machado, um martelo e um serrote de madeira.

Tudo começa, ainda criança quando constrói os seus primeiros brinquedos de madeira. Surge a oportunidade de começar a produzir para os outros e vender os seus camiões de madeira para comprar rebuçados. Podemos dizer que estes são os primeiros "idalécios", que ainda na altura muito certinhos são construídos sempre com um objectivo eterno: serem uma resposta à necessidade de explorar a liberdade e de efectivamente sentir-se livre.
Mais tarde, já em adulto, a criação dos seus bonecos é o artifício da descarga da mono temática, metodologia, e stress depois do seu dia de trabalho na fábrica. O fim do dia era então o momento de criação. O estímulo dependia, e ainda depende, sempre do espírito, mas acção é sempre à machadada, seca mas robusta, e forte. Forte como o querer dentro da sua alma – convicção que acredita que é a única que faz o ser humano avançar e conseguir.

A curiosidade embebida na sua personalidade faz com que tenha uma fase de “monge copista” e aprende técnicas de pintura ao copiar Matisse, Picasso, Van Gogh. A proximidade surrealismo e ao impressionismo, mesmo que em primeira instância seja meramente técnica, é palpável nas suas criações. Não só a peça em si, mas as histórias que cria à volta delas. As viagens do desenvolvimento da alma dos seus “bonecos” originam textos, parágrafos que ocupam folhas de agendas que não se equivalem ao dia da produção, sob um olhar humilde e livre.

Quando cria, procura exponenciar o pensamento à volta dessa intenção de produção. Essa é a máxima preocupação. Simultaneamente, reduz o mínimo de materiais e ferramentas que usa. Assume-se um contrariador, popular e criativo, genuíno e rude. Prefere ficar sempre ao fundo da sala mas procura ser cativante sem querer agradar fregueses. Pretende ser um objecto de olhares – sejam eles treinados ou treinar com eles.

E porque cria? "Porque acha que deve aproveitar criar, pelo menos 1% do que lhe vai na alma. O esqueleto não consegue, nunca, acompanhar o pensamento. Bom será não pensar".

Começou a expor em colectivas desde 2016 com a Galeria de arte bruta Cruzes Canhoto no Porto onde salienta a sua primeira individual nesse mesmo ano denominada " D'Idalécio temos todos um pouco":

Idalécio, agora com 71 anos e já reformado, é oriundo da região de Águeda, permanece aí com a sua família, depois de uma vida dedicada à indústria metalúrgica, às máquinas e aos operários, na sua casa e oficina criando quando quer e como lhe apetece.

Texto por Inês da Câmara